A vivacidade da morte

02/01/2013


 Aparentemente tudo continua o mesmo. Vivo na mesma cidade, com os mesmos amigos, com a mesma rotina.
 Continuo vendo documentários do Discovery Channel e History que tantas vezes já comentei em nossas conversas que desenrolavam em soluções filosóficas e dramáticas.
 Continuo indo ao cinema as sextas-feiras, passando pelo mesmo trajeto, comprando doces no supermercado, e sentando na mesma fileira e olho casais e amigos conversando, trocando olhas cúmplices e risadas altas. E lembrando que já fui um deles.
 Eu ainda mecho muito no cabelo, porque ele me incomoda, mas não há ninguém que segure a minha mão e diga;  ''Fica quieta!''.
 Minha mente permanece criando teorias e mais teorias sobre a vida, o comportamento humano e o meio ambiente, mas não há ninguém para partilhá-las.Entro nas redes sociais no mesmo horário e escuto as mesmas músicas, mas não há nada que me motive a permanecer lá e dar uma continuidade nas conversas banais.
Tento manter o mesmo senso de humor que me caracteriza, com comentários estranhos, desenterrando vocabulários esquecidos, além da boa dose de sarcasmo. Mas aparentemente as minhas piadas não tem tanta graça, a risada ecoada pelo receptor da mensagem não me alegra o quanto me alegrava ao ouvir gargalhada rouca e ver a cabeça pendendo ligeiramente para trás pela incredulidade e diversão da minha fala.

 Tudo continua o mesmo. Meu rosto permanece rechonchudo intacto pela juventude que ainda me pertence. Minhas mãos ainda são calejadas e minhas unha duras quadradas. Meu corpo magro continua com tudo nos ''Trinks'' como a minha mãe fala. Mas quando me olho no espelho encaro uma desconhecida. 
 Os lábios avermelhados não pendem mais para os lados em um meio sorriso, mostrando a lasca do dente que quebrou quando era criança. Os olhos  castanhos que continham ali um brilho e vivacidade, estão vazios como o de uma senhora idosa desesperançosa na vida enquanto aguarda o seu fim. A  pele morena parece mais pálida e sem cor. Os cabelos negros sem vida. O corpo magro, magro até de mais.
 E por mais que eu procure voltar o que era antes. Continuo sendo um fantasma do meu antigo eu.Virei um fantasma na minha própria vida, assombrando as pessoas a minha volta. Sou reconhecível para todos menos para mim mesma. Rondo os lugares que vivi, atormento as pessoas que amei, mas não consigo encontrar aquele que me tornou assim, ele perdoou a si mesmo pelo que me tornou. Por que ele assim como eu já deixou de existir.

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